sexta-feira, 18 de maio de 2012

EUFRÁSIA MENESES, de Ronaldo Correia de Brito.


– Sentada estou. É aqui que me vêem todas as tardes e me imaginam a esperar a noite. O que mais esperaria além da passagem da claridade? A hora em que me trancarei no meu quarto à espreita de um visitante que rondará a casa e que nem sei se é real ou se urdido pela minha fatigada solidão? Meu marido é incerto no vir, e todos o sabem. Pressentem que anoiteço e, se passam à minha porta, me perguntam: “Esperando a noitinha, dona Eufrásia?”. Mas o que me trará a noite além de um vento frio e de um silêncio fundo? O cheiro de carne apodrecida do gado morto neste ano de seca, um bater de portas que se fecham, o balido de ovelhas se aconchegando, o fungar das vacas prenhes, o estalar das brasas que se apagam no fogão.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Aquela que não quis ser...


Clarrisa Macedo*
Nunca a mulher eleita
a mãe, a caseira. Jamais
a primogênita aceita.

Nunca a preferida assumida
ou a bela primeira legitimada.

Sempre a repartida, a preterida.
Dentre todas inteiras, a fragmentada.

Nela só a astúcia cruel,
molemente enraizada.

Só que a vida deu de adoecer
nela se putrefar
deu de sucumbir, se escrever
desabrochar

e desabafando,
a jogou bem no meio do mar.


*Clarissa Macedo é revisora e escritora. Nasceu em Salvador, em 1988, mas reside em Feira de Santana. Cursa Mestrado em Literatura e Diversidade Cultural (UEFS). Faz parte das coletâneas Godofredo Filho (2010), Sangue Novo (2011) e Verso e Prosa (2011). Participou, em 2011, da IV Feira do Livro de Feira de Santana e da 10ª Bienal do Livro da Bahia na abertura da Praça de Cordel e Poesia.